sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Acho que esse galo veio de Igarassu

Acho que esse galo veio de Igarassu

Venho de família nordestina, pernambucana de pai e mãe. Nasci no Rio de Janeiro mas criado “a moda” nordestina, já aprendendo os gostos da” terrinha”, uma boa tapioca, bolo de rolo, manguzá, agulha frita, valorizando a família e os amigos, falando alto e se achando o maior, isso é o óbvio. Desde menino gostava das estórias fantásticas dos desbravadores daquelas terras, dos ricos senhores de engenho e dos seus filhos bastardos, aventuras que me orgulhava e sempre remetiam à sapiência e esperteza de um povo sofrido. Recife, cidade pequena porém decente ! O Beberibe se encontra com o Capibaribe prá que? Pense, não é pouca coisa não... Formar o oceano Atlântico! E isso é ensinado nas escolas com orgulho de ser nordestino. Uma sobrinha vinda ao Maracanã saiu-se com essa pérola “Tio, sei não, mas o Arrudão parece ser maior...” Rapaz, Eu é que não vou questionar essas verdades de uma terra que expulsou um grupo de judeus incompetentes para eles fundarem aquela ilhota do norte, uma tal de Nova York. Graças a Deus os competentes ficaram “ no Recife !”
Igarassu, cidade próxima de Recife, muito antiga, vejam:
“O município localiza-se no litoral norte da Região Metropolitana, e possui um dos patrimônios mais invejáveis e expressivos da arquitetura de cunho civil e religioso do Brasil. Lá se encontra a mais antiga igreja em funcionamento do país (1535), de São Cosme e Damião, a quem é atribuído um milagre, em 1685: quando as cidades de Recife, Olinda, Itamaracá e Goiana foram assoladas pela febre amarela, Igarassu escapou ilesa da praga.”
Nesta cidade um parente afastado, Coronel Siqueira Brito, tinha nas proximidades sua propriedade, sua mulher, filhos, criados e animais. Homem conhecido pela sua maldade e objetividade, não se satisfazia com pouco, ambicioso, poderoso dono de terras e de gente. Gente sim, naquele tempo os criados eram parte da propriedade, dizem que ele escolhia as meninas (filhas dos seus serviçais) na época em que os seios da jovem ficavam do tamanho de um limão, era a senha dele “Está na hora do abate” e a menina escolhida era usada. A mulher era passiva, não reclamava quando sabia, mas estranhava quando o varão não comparecia com o dever semanal, dizem que ela, antes de se recolher consultava seu dono “Vóismecê vai me ocupar?” Pergunta direta para, em caso afirmativo, ela se asseiar.
A vida era lenta e os grandes acontecimentos raros. Um dia chegou um primo das bandas do sul, com novidades e boa conversa, moço da cidade, letrado. O coronel levou-o até Recife , via Igarassu, se despedindo de Mariazinha, a esposa, com um sonoro “ já volto !“ . Foram em bons cavalos até Igarassu e de lá para Recife, era mês de carnaval e as putas da terra não ofereciam um diferencial de peles brancas e olhos claros das polacas e francesas do Rio de Janeiro. O primo rico lançou o convite “Vamos, meu primo, para conhecer um carnaval de verdade!” Lançaram-se em um vapor e dias após aportaram na Praça Mauá, antro de fêmeas, malandros e bebidas. Foi uma festa! Mulheres brancas como neve, petelhos loiros nunca vistos, perfumes franceses e até champanhe ele tomou, e muito bebeu. Farreou e voltou com uma maldita blenorragia clássica, sem antibióticos fez o tratamento local com permanganato de potássio, pingado na uretra, na cabeça inchada e dolorida do tão utilizado instrumento do amor...
Voltou prá casa, um mês depois, galopante, feliz, com um vidro no bolso e a séria recomendação médica de se abster de atividade sexual, principalmente com a digníssima esposa, por três malditos meses. O que foi feito a risca! Mariazinha logo desconfiou de outra mulher, o coronel não cumpria com o dever! Sempre que voltava de viagem ele era mais amoroso com a fêmea oficial, mais por remorso ou um pouco de caridade, bom coração, bom homem, pai exemplar.
Domingo de calor e vento, a tardinha refrescou. Deitado na rede ficou vendo a propriedade do alpendre, cachacinha do lado pensando nas coxas grossas e bem fornidas de Margot, a francesa fogosa que deixou prá trás, o pau respondendo ao pensamento já endurecia mas doía... Triste isso. Mais triste estava à esposa carente de sexo, orgulho ferido, tomava banho e vestia uma anágua rosa que tanto alegrava o parceiro na cama e ele nada, chegava a cafungar na nuca dele, nada. De repente uma vontade de falar, questionar o macho, mas cadê a coragem, isto é má educação, mulher não procura homem, aonde já se viu! E cobrar a obrigação matrimonial nunca! Como fazer se perguntava a triste Mariazinha, entretida com sua costura, sentada do lado do seu senhor. Um barulho, uma correria e lá vinha um galo na frente, pulando e se safando das bicadas das enfurecidas galinhas, Mariazinha chamou bem alto o menino negrinho e descalço que passava, “Ô esse menino, vá pegar esse galo prá fazer uma canja prá Ceia pois eu acho que esse danado veio de Igarassu” O coronel se engasgou com a pinga, tossiu e sentiu que o pau amolecia de vergonha... Só falta um mês mariazinha, pensou ele ajeitando a meia e dizendo prá ela “vou à vacaria e não volto prá ceia não, estou com um fastio danado hoje”.

Roberto Solano

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