Desligando o
despertador
Revi
colegas de ginásio. Pausa para uma explicação: ginásio, caro leitor, não é
somente aquele lugar destinado às práticas esportivas não. Há outra aplicação
para o nome: estudo fundamental, isto lá nos idos anos 70, eram primário,
ginásio e científico (para a área tecnológica). Pois bem, esses encontros são
adoráveis para resgatarmos o nosso lado criança que está afogado nos problemas
adultos, nas responsabilidades... Entre comparações de barrigas e cabelos (quando
existem) brancos a alegria impera regada a muito chope, no aniversário do
Marcílio.
A mesa estava destacada com símbolo do São
Bento, nosso colégio, tendo direito a uma camisa azul oficial do colégio! Todos
os presentes autografaram para o nobre aniversariante, foi uma delícia.
Entre papos
diversos eu conversei com o mais inteligente da época, o garoto nota 10. Sim,
ele era “o cara”, forte na matemática moderna do professor Irineu Pena, que era
introduzida no Brasil. Sim o sujeito estudava, tinha comportamento adequado e irrepreensível
para tão rigorosa instituição de ensino: o colega Noaltir. Ele, como cada um de
nós, tocou a vida com sucesso, levando na bagagem as aulas bem aplicadas sobre
o aluno aplicado, ao contrário dos outros meninos endiabrados que ficavam na 2ª
época.
Vamos ao tema.
Todos temos o desejo de parar, ou pelo menos ter esse direito. Parar de
trabalhar, um sonho para os trabalhadores que sofrem com a dura rotina dos
horários e distâncias, do patrão ou da patroa, dos compromissos. O nosso herói
estava muito feliz com o acontecimento: aposentou-se. E prá valer! Com todo o
orgulho do dever comprido e do desfrute vindouro. Portava uma bela camisa
colorida (estilo havaiano) para a vida que se abria em novas cores e
perspectivas no merecido descanso e descompromisso. Sim, essa era a alegria
maior, o maior desejo que meu amigo tinha incrustado no seu coração: o
descompromisso. E foi assim que ele me contou da felicidade maior de, após
assinar todos os documentos da sua merecida aposentadoria, voltar para casa
driblando os parabéns dos familiares e amigos para, sem uma palavra, caminhar
até seu quarto. Adentrou e desligou seu despertador! Sim, isso foi o ato final
no teatro de uma vida dedicada e comportadamente adestrada pela maquininha
barulhenta da sua cabeceira: o maldito despertador! Castigo diário de um
zumbido doloroso que o tirava de seu sono matinal. Máquina infernal que
alimentava outro sonho acordado: a aposentadoria. Isto foi feito com muita
atenção e cuidado, para não errar e apertar firmemente o botão “off”. Rolou um
prazer sádico e vingativo de um torturado contra seu torturador. Desligou a
caixinha com mãos precisas de um cirurgião cardíaco para nunca mais ouvir ela tocar...
Esse é hoje o seu maior prazer: acordar e olhar para o instrumento mudo de
medir o tempo, que agora não tem mais sentido. Não há máquina para medir o sono
tranqüilo de um herói voltando da batalha de uma vida dura... Só uma medalha de
honra ao mérito, das tantas que ele ganhou no São Bento é que pode ser colocada
ao lado, na sua cabeceira, para coroar o dever sempre comprido do melhor aluno
que o colégio teve, e para mim nunca haverá outro igual! Parabéns amigo Noaltir, que os anjos embalem
seu sono tranqüilo de muitas e muitas noites sem o castigo de acordar a contra
gosto. Você merece!
Roberto Solano
Nenhum comentário:
Postar um comentário