quarta-feira, 15 de março de 2023

O parto de Sá Juvita

 Sá Juvita já está com as dô 


Nos anos 70 eu morava em Ipanema, um sonho que só quem viveu pode avaliar: praia com o píer, liberdade, juventude e felicidade Jobiniana. Lá fui feliz em terras litorâneas até que meu pai faliu sua empresa e fomos morar no Alto da Boa Vista, lugar mais frio e isolado, os mosquitos eram meus companheiros. Meu pai, um amante da boa música, convidou o Quinteto Violado que vinha de Pernambuco para mostrar a música nordestina em novo formato. Uma beleza de conjunto com músicos de excelente qualidade. Lá, naquela casa, eles bebiam e comiam bem ( minha mãe fazia os almoços de domingo) e éramos brindados pelo repertório nordestino do Quinteto. Levei meus amigos pra ver, no meio deles o Antônio Castro. A música mais interessante era um cordel que contava a história do " Parto de Sá Juvita", uma jovem esposa de um bravo coronel do sertão. Resumindo: dterminada hora a esposa do coronel sente que o rebento está pra rebentar (como diria Chico Buarque) e o coronel chama Tonho:

" Tonho, sele essa bestinha malhada e risque pois Sá Juvita está com as dô" e respirando pesado e aflito faz a ameaça " olhe Tonho, eu vou cuspir no chão e tu tem que vortar antes do cuspe secar". Urgência é urgência! E lá partiu Tonho em busca da parteira. Cabra bom e rápido demais, fez o serviço mas o menino encruou... E tome reza, aperta daqui, respira fundo de lá e nada... Então a solução foi dada por Tonho: " vamos rezar a reza de Santo Antônio pequenino " todos seguiram em voz alta " Santo Antônio pequenino, amansador de burro bravo, fazei nascer esse menino com mil e quinhentos diabos". Nasceu, nasceu!!!

O choro veio " cuêmmm, cuêmmm". O coronel pegou a garrucha e lá no lado de fora gritou" nasceu o filho do coronel Antônio Brito, cabra macho, podem ver os documentinhos dele, é roxo ". E tome alegria.

Assim começou uma amizade de mais de 40 anos com o Antônio de hoje, tão astuto quanto o Antônio da música. Quando ele se ia se atrasar eu dizia " eu vou cuspir no chão, vice Tonho, tu tem que voltar antes do cuspe secar ". Ele sorria. Nunca deixou de voltar a tempo. Hoje já não pertence mais ao nosso mundo e deixa uma saudade imensa em meu coração. Siga meu amigo, montado na sua bestinha malhada e risque, para um mundo onde não há pressa, só paz.

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